

A Inteligência Artificial (IA) têm sido apontada como uma das tecnologias mais transformadoras da logística moderna. No entanto, apesar da popularização de chatbots e ferramentas generativas, ainda persiste a dúvida: a IA está realmente pronta para desenhar a malha logística do Brasil?
Este artigo discute essa questão a partir de fundamentos teóricos, limitações práticas e, sobretudo, resultados já aplicados no desenvolvimento de modelos híbridos, que combinam otimização matemática e redes neurais artificiais para o desenho de redes logísticas (SCND — Supply Chain Network Design).
Além dos Chatbots: O que é IA e o que ela Pode Fazer na Logística
A Inteligência Artificial corresponde à capacidade de máquinas aprenderem padrões a partir de dados históricos ou simulados. Embora tenha se tornado mais visível por meio de interfaces conversacionais, sua contribuição real na logística está na habilidade de:
Diferentemente da ideia de “robôs que pensam sozinhos”, a IA na logística atua como um acelerador de inteligência humana, ampliando o alcance da análise, reduzindo esforço manual e aumentando a precisão das decisões.
Entretanto, vale destacar: IA sem bons dados, sem especialistas e sem contexto local pode gerar resultados ruins, exatamente como chatbots fornecem respostas equivocadas quando recebem instruções mal formuladas.
Onde a IA Realmente Agrega no Planejamento Logístico?
As principais contribuições da IA no planejamento de redes incluem:
A IA não substitui especialistas. Ela amplia a capacidade de análise quando integrada a ferramentas robustas, como o FOCS, tecnologia desenvolvida e utilizada pela INPO, totalmente personalizável para as especificidades operacionais de cada cliente.
O Problema Clássico de Desenho de Malha
O Supply Chain Network Design (SCND) é um dos problemas mais desafiadores da engenharia logística. Ele envolve definir:
quantas instalações abrir;
onde posicioná-las;
suas capacidades;
o tipo de operação (fábrica, CD, cross-docking, HUB etc.);
custos logísticos associados (fixos, variáveis, transporte e operação);
fluxos entre fornecedores, plantas e clientes.
Como objetivo geral, busca-se minimizar o custo total esperado da rede, respeitando restrições físicas, de demanda, de capacidade e de nível de serviço.
Por sua natureza combinatória (com bilhões de combinações possíveis), problemas de SCND são excelentes candidatos para abordagens que acelerem o processo. É aqui que a IA se torna especialmente útil.
O Processo Completo de Desenho de Malha: Do Problema à Decisão
O desenho de malha segue um pipeline estruturado:
Em praticamente todas essas etapas, o conhecimento do especialista é indispensável. Porém, várias delas podem ser aceleradas ou enriquecidas com IA, especialmente no processamento de múltiplos cenários e identificação de padrões nas soluções.
Redes Neurais no SCND: Metodologia Aplicada no Estudo
Com base em seu doutorado, Cauê Guazzelli aplicou e avaliou três tipos de Redes Neurais Artificiais para apoiar o processo de SCND, usando como referência o problema Capacitated Fixed-Charge Facility Location (CFCFL), um dos modelos mais estudados no campo de localização de instalações.
A abordagem consistiu em:
4. Usar as previsões para restringir modelos matemáticos, acelerando seu processamento.
5. Comparar desempenho entre modelos completos e restritos.
Principais Achados: O Que a IA Entregou de Fato
Como resultados, os modelos obtiveram:
E esses resultados mostram que:
Em outras palavras:
Inteligência Artificial somada à Modelagem Matemática se traduz em uma integração mais robusta para apoiar decisões estratégicas de desenho de rede.
Reflexão Final: A IA Está Pronta para Desenhar a Malha Logística do Brasil?
Ainda não. Ao menos, sozinha, não está.
Mas quando combinada com:
a IA se torna uma alavanca poderosa para reduzir prazos, aumentar a confiabilidade das análises e viabilizar estudos antes inviáveis pelo tamanho dos dados ou complexidade.
Não estamos diante de promessas futuristas, estamos falando de aplicações reais, já em uso e cientificamente validadas.
A IA não substitui o analista. Ela amplia sua capacidade de pensar redes logísticas mais inteligentes, mais eficientes e mais alinhadas às necessidades do Brasil.
* Cauê Guazzelli é Sócio-fundador e diretor da INPO, PhD em Planejamento e Operação de Transportes. E-mail: caue@inpo.com.br
* Isabel Campeão é analista de marketing na INPO. E-mail: isabel@inpo.com.br