O roubo de cargas continua sendo um dos maiores desafios logísticos do Brasil, e suas consequências vão muito além do valor financeiro das mercadorias subtraídas. Segundo dados consolidados da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), o país registrou mais de 10 mil ocorrências em 2024, com prejuízos estimados em R$ 1,2 bilhão. Apenas no primeiro semestre de 2025, os roubos aumentaram 24,8% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Esse cenário afeta toda a cadeia logística, atingindo transportadores, embarcadores, seguradoras e, indiretamente, o próprio consumidor. O roubo de cargas é, na prática, um ataque sistêmico à eficiência do transporte rodoviário, responsável por mais de 60% da movimentação de bens no país, de acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT). Quando um caminhão é interceptado, o dano ultrapassa o valor da carga: ele interrompe fluxos, gera custos adicionais e desestrutura toda uma cadeia.
Impactos operacionais e econômicos
Entre os efeitos imediatos está a necessidade de contratar transporte emergencial para substituir o veículo roubado e garantir o cumprimento de prazos. Além disso, há o retrabalho na cadeia de suprimentos, interrupção de entregas, atrasos na produção — especialmente quando a carga roubada consiste em um insumo industrial — e, em casos mais graves, cancelamento de contratos ou perda de clientes estratégicos. A consequência é uma espiral de custos que reverbera em toda a operação.
Esses impactos ajudam a explicar por que o custo logístico no Brasil representa cerca de 12% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo a CNT — uma proporção significativamente superior à de países com estruturas mais seguras e eficientes, como os Estados Unidos (8%) e a Alemanha (7%). A diferença reflete não apenas fatores de infraestrutura, mas também o peso das perdas com criminalidade, o custo de seguros e as medidas adicionais de mitigação que as empresas precisam adotar.
Perdas intangíveis e desgaste institucional
O problema também atinge dimensões intangíveis. Há a perda de confiança de clientes e parceiros, que passam a exigir cláusulas de segurança mais rigorosas e a rever acordos comerciais. A imagem de transportadoras e embarcadores pode ser abalada, especialmente quando os incidentes ganham repercussão pública.
Além disso, surgem processos judiciais, regulações de sinistros complexas e sindicâncias prolongadas, que consomem tempo e recursos das empresas.
O setor de seguros sente o impacto direto dessa instabilidade. De acordo com a Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg), o aumento da frequência e da severidade dos sinistros fez com que os prêmios médios de seguro de transporte subissem cerca de 18% entre 2022 e 2024. Em alguns casos, as seguradoras negam cobertura ou exigem apólices mais caras e específicas para determinadas rotas. Como reflexo, as transportadoras precisam investir mais em escoltas e tecnologias de monitoramento, elevando novamente o custo operacional.
O impacto humano e social
Outro componente frequentemente negligenciado é o impacto humano. O roubo de cargas coloca motoristas e equipes em risco físico constante. Situações de sequestro e violência geram estresse, afastamentos por trauma e aumento do turnover entre profissionais experientes.
Além dos custos trabalhistas, há perda de produtividade e de confiança no ambiente de trabalho, fatores que comprometem a continuidade operacional e o capital humano do setor.
Reflexo no preço final e na competitividade
No fim da cadeia, o consumidor também paga essa conta. Cada ponto percentual de aumento no custo logístico tende a refletir no preço final de bens de consumo e produtos industriais.
No Brasil, o frete pode representar até 15% do valor final de um produto, quase o dobro da média observada em países com logística mais eficiente, como a Alemanha (8%), segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Ou seja, o crime contra o transporte de cargas não é apenas um problema de segurança: é um fator de encarecimento sistêmico da economia.
Segurança como ativo estratégico
Combater esse cenário exige uma visão integrada entre setor público, transportadores, embarcadores, seguradoras e gerenciadoras de risco. Não se trata apenas de reagir a ocorrências, mas de estruturar uma cultura preventiva, baseada em informação e rastreabilidade.
Investimentos em inteligência logística e coordenação entre agentes de transporte reduzem vulnerabilidades e fortalecem toda a cadeia. A segurança, nesse contexto, deixa de ser um custo isolado e passa a ser um ativo estratégico essencial para a competitividade e sustentabilidade do transporte brasileiro.