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Uso de hidrovias e cabotagem: racionalidade na logística brasileira

Por Ana Tereza Spinola e Antonio Freitas em 15 de junho de 2015 às 16h27 (atualizado às 16h44)
Ana Tereza Spinola
Antonio Freitas

O Brasil, país com a maior reserva de água doce do mundo, a maior bacia hidrográfica do planeta (Amazônica), e o quarto maior potencial hidroviário do mundo, com 50 mil quilômetros de rios navegáveis, tem inacreditáveis dificuldades logísticas que compõem o Custo Brasil. Os recordes deste recurso natural, no entanto, não são suficientes para livrar o país da maior crise hídrica de sua história e, tampouco, do preocupante gargalo logístico que traz uma série de prejuízos socioeconômicos, pois encarece os produtos, reduz a competitividade e onera as empresas, impedindo que estas invistam mais e criem empregos.

A grande bacia hidrográfica brasileira, bem como a sua imensa costa navegável de 7,5 mil km de extensão e com mais de 30 portos instalados, continuam sendo desprezadas pelas autoridades governamentais, por razões desconhecidas e um tanto irracionais. Vale lembrar que o Brasil já teve a maior frota de cabotagem do mundo. Frente a este cenário e aos desafios futuros, a infralogística nacional precisa ser repensada urgentemente. Pergunta-se: por que não investimos mais e aproveitamos melhor a nossa riqueza hidrográfica, o que tornaria os custos de transporte até 50% inferiores aos atuais, além de garantirmos mais segurança e benefícios socioambientais?

O potencial hidroviário brasileiro é, por exemplo, superior ao dos Estados Unidos, segundo dados do Banco Mundial. Para se ter uma ideia, seria possível utilizar 50 mil quilômetros de hidrovias no Brasil – número menor apenas do que da China (110 mil quilômetros), da Rússia (102 mil quilômetros) e da União Europeia (52 mil quilômetros). Atualmente, aproveita-se apenas 28% da nossa capacidade, ou seja, 14 mil quilômetros. Os Estados Unidos têm 41 mil quilômetros de hidrovias, nove a menos que o Brasil, mas todos são usados regularmente, conforme a Agência Central de Inteligência.

O Brasil poderia e deveria ser completamente navegável do Oiapoque ao Chuí, pontos extremos de norte a sul, com relativamente pequenos investimentos e grandes retornos. Há uma clara viabilidade econômica para construir hidrovias, incentivar a cabotagem e, eventualmente, interligar estes sistemas às atuais ferrovias, como ocorre em diversos países do mundo. É possível, inclusive, torná-las eficientes, sem usar recursos públicos, por meio de concessões a empresas privadas qualificadas.

A interligação destes três modais vai gerar maior competitividade para os produtores brasileiros, incrementando o Produto Interno Bruto (PIB) e as exportações. Além disso, vai melhorar, substancialmente, a qualidade do ar pela diminuição do gás carbônico emitido pelo transporte rodoviário e reduzir os engarrafamentos e o número de acidentes. Pesquisas apontam que o modal hidroviário apresenta uma eficiência energética (relação carga/potência) 29 vezes superior, um consumo de combustível 19 vezes menor, e uma emissão de gases poluentes seis vezes inferior do que o modal rodoviário.

Levantamento recente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) revelou, ainda, que apenas 11% das rodovias do Brasil são asfaltadas. Com uma infraestrutura precária e com os altos valores envolvidos, o modal rodoviário custa três vezes e meia mais do que o ferroviário e nove vezes mais do que o fluvial. Desta forma, fica difícil compreender como o transporte rodoviário continua predominante no Brasil. Atualmente, na Matriz de Transportes Brasileira, o modal rodoviário representa 65,6% do total; o ferroviário 19,5%; a cabotagem 9,6%; o dutoviário 3,4% e o hidroviário apenas 1,8%.

A logística é um dos principais entraves para o crescimento da produção agrícola, industrial e comercial no Brasil. Os investimentos realizados em infraestrutura não acompanham o crescimento da produção, gerando graves gargalos logísticos para o escoamento. Atualmente, cerca de 50% de nossa produção agrícola é desperdiçada simplesmente pelas paupérrimas vias brasileiras.

Analisando os prejuízos dos produtores de todo o Brasil por conta da ineficiência logística, o déficit chega a R$ 9,6 bilhões. Além das perdas serem significativas para a economia brasileira, elas têm crescido a uma taxa média de 6% ao ano. Se os prejuízos continuarem aumentando dentro dessa média, como ocorreu nos últimos oito anos, o valor acumulado chegará a R$ 1,009 trilhão em 35 anos.

A falta de racionalidade logística vem fazendo o Brasil amargar resultados insatisfatórios nos rankings mundiais. O país está na 65ª posição da Logistics Index Performance 2014, lista do Banco Mundial que avalia, a cada dois anos, a qualidade logística de 160 países. Em 2012, o Brasil ocupava a 45ª colocação. Os Estados Unidos, por sua vez, aparecem em 9º. Quem lidera é a Alemanha, seguida por Holanda e Bélgica.

Uma importante solução para reverter de vez este preocupante gargalo, é concentrar mais os investimentos nos transportes via hidrovia e cabotagem, modernizar a frota de navios e barcaças, e aumentar a integração multimodal. Uma ideia para alcançarmos este objetivo, utilizando-se da física básica, é explorar o efeito dos vasos comunicantes, por meio de um sistema de mão dupla. Quando tivermos excesso de água na Região Amazônica, por exemplo, o volume excedente poderá fluir para o nordeste, sudeste e outras áreas necessitadas e vice-versa.

Com isso, será possível manter o nível adequado de água em todas as regiões, viabilizando, assim, não somente o transporte fluvial, como também se evitaria enchentes em determinados locais e a falta d´água nos demais. Em paralelo, será preciso investir mais em projetos de desassoreamento, recuperação das margens ciliares e renaturalização de rios e córregos, além de adotar uma rígida política contra a ocupação irregular das margens.

Somente com todas estas ações vamos conseguir, enfim, dar racionalidade à logística brasileira e nos livrar da prática do escoamento na base do improviso. Os governos federal e estadual precisam traçar e adotar um plano estrutural logístico integrado que desenvolva todos os modais, sobretudo, os fluviais. Apenas uma política sólida de investimentos públicos e privados neste setor vai livrar o Brasil do atual apagão logístico e fazer com que o país passe a transportar as suas riquezas de forma mais eficiente e consiga alcançar o desenvolvimento pleno sustentável de que tanto precisa.

 

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