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Seguro de RC-V: proteção que a todos interessa

Por Rosa Gehlen em 17 de julho de 2025 às 8h14
Rosa Gehlen
Rosa Gehlen

O seguro de RC-V, o Seguro de Responsabilidade Civil de Veículo, tem por finalidade conferir cobertura indenizatória para perdas e danos materiais e corporais causados a terceiros pelo veículo de carga, ainda quando vazio, ou pela carga por ele transportada.

Quando a Medida Provisória 1153/2022 foi publicada, o único seguro obrigatório do transportador rodoviário de cargas era o RCTR-C (seguro de responsabilidade civil do transportador rodoviário de cargas) respeitada a historicidade prevista desde a publicação do Decreto 73/1966.

No entanto, no curso da conversão da MP na Lei 14.599/2023, que alterou o artigo 13 da Lei 11.442/2007, tanto o seguro de RC-DC (Seguro de Responsabilidade Civil por Desaparecimento de Carga) quanto o Seguro de RC-V acabaram tornando-se obrigatórios inaugurando, assim, uma nova fase para os “seguros de cargas”.

O seguro de RCTR-C e RC-DC, regulamentados pela Resolução CNSP 472/2024, beneficiam proprietários de cargas ou embarcadores, garantindo a indenização aos danos causados em razão da realização dos riscos previstos.

O seguro de RC-V, por sua vez, desponta como um seguro “pró-terceiros”, pois nos termos da exposição de motivos da MP 1153/2022, considerou-se que “os veículos possuem características de dimensão e peso capazes de provocar danos consideráveis a pessoas e bens que trafegam em nossas rodovias”.

Regulamentado pela Susep pela edição da Resolução CNSP 478, publicada em 27 de dezembro de 2024, o Seguro de RC-V é o novo ramo 59 do grupo 06 dentre os Seguros de Transporte, como definido pela Circular Susep 51/2025 e, embora obrigatório há dois anos, segue ansiosamente aguardado, pelo menos dentro dos moldes almejados pelo legislador.

 

Um Setor Estratégico em um Cenário Crítico

O transporte rodoviário de cargas é responsável por movimentar aproximadamente 65% de tudo que é produzido e distribuído no Brasil e conta com cerca de 800 mil transportadores, entre empresas, autônomos e cooperativas, que conduzem pouco mais de 2,5 milhões de veículos, segundo dados da Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT).

No entanto, o setor opera em um cenário multiplamente desafiador.

Um deles é a infraestrutura viária. Segundo a Pesquisa CNT Rodovias 2024, da Confederação Nacional do Transporte (CNT), dos 111.853 quilômetros de rodovias federais e estaduais avaliados, 67% foram classificadas como “regular, ruim ou péssimo” por apresentarem algum tipo de problema na pavimentação, sinalização ou na geometria.

Esses dados se somam aos frequentemente divulgados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) e foram sistematizados num estudo realizado em 2023 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que fez um balanço da primeira década de segurança viária no país.

Nesse estudo, apurou-se que dentre as principais causas dos acidentes rodoviários, em geral, estão a falta de atenção, o excesso de velocidade e a inadequação da geometria ou das condições gerais da própria via.
Além da lastimável perda humana, o impacto econômico é imenso.

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) calcula que 1,35 milhão de pessoas morrem anualmente em acidentes de trânsito no mundo. Estima-se que o Brasil, que ocupa o 3º lugar entre os países com pior desempenho em segurança viária perdeu, somente em 2022, quase 13 bilhões de reais com acidentes rodoviários e deixou de auferir nos últimos oito anos, aproximadamente 250 bilhões com as vidas perdidas, conforme concluiu o Centro de Liderança Pública (CLP), num estudo divulgado em setembro de 2024.

Nesse enredo, onde os investimentos públicos tornam-se cada vez mais escassos, relembremos o DPVAT.

 

“Sai de cena o DPVAT sobe ao palco o seguro de RC-V”

O Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não, previsto pelo Decreto 73/1966 e disciplinado pela Lei n.º 6.194, de 19 de dezembro de 1974, foi extinto em 2020 pela MP 904/2019, ganhou uma nova roupagem pela LC 207/2024 como SPVAT, mas antes de entrasse em vigor a LC 211/2024 incumbiu-se de decretar a nova extinção.

O RC-V, com coberturas mais amplas do que o DPVAT, ao seu turno, é uma peça-chave na mitigação dos prejuízos, seja os causados às vítimas de acidentes rodoviários envolvendo veículos de carga, seja em favor do próprio transportador, que encontra no seguro um investimento para ter proteção financeira que colabora com a longevidade do seu negócio.

Obviamente não é a solução dos problemas, pois são muito mais profundos, no entanto como sugere a lição atribuída à Sun Tzu “é questão de vida e morte, um caminho para a segurança ou para a ruína, portanto é um tema que não pode ser negligenciado”.

 

O Papel das Seguradoras em Ofertar o “Novo” Seguro

Passados vinte e quatro meses da entrada em vigor da Lei 14.599/2023 e mais de cento e oitenta dias da Resolução 478/2024, o mercado segurador apresenta lacunas.

As poucas ofertas em poucas seguradoras ainda se distanciam do seguro estipulado como obrigatório, que possui regras específicas, tais como: “apólice coletiva” entre o transportador tomador do serviço e os transportadores autônomos (TAC); “contrato de seguro por viagem em nome do TAC subcontratado”; “apólice globalizada” para a frota do transportador; além da previsão de aceitação do risco para a qual o “veículo não esteja realizada atividade de transporte de cargas”.

Obviamente, e isso é um fato, são necessárias adaptações sistêmicas, operacionais e um bom apetite ao risco, tampouco se desconsidera o fato de que as Seguradoras gozam da livre iniciativa de ofertar o seguro, nos termos do artigo 170 da Constituição Federal, pois momento algum estabeleceu-se a obrigatoriedade de oferta pelas Seguradoras.

Mas aí cabe dizer que a nova Lei de Seguros (Lei 15.040/2024) traz pelo menos duas disposições interessantes que podem ser aqui mencionadas, o artigo 51, no sentido de promover critérios comerciais e de subscrição baseadas na solidariedade e desenvolvimento econômico e social; e o artigo 125, que reconhece a função social dos seguros obrigatórios.

Além disso, é preciso crer na força do mutualismo, pois é um seguro que a todos interessa, e certamente garantirá que o Seguro de RC-V realize a missão para o qual foi instituído, proteger múltiplos interesses, sob múltiplas perspectivas, com a marca de ser socialmente relevante.

Ademais, não se pode perder de vista a “porta aberta” prevista pelo artigo 20, da LC 126/2007, a quem possa interessar para além das “Terras Brasilis”.

Conclui-se, assim, que o cenário é complexo e os desafios ora refletidos são inúmeros, mesmo assim é imprescindível que todos os envolvidos reflitam acerca da sua responsabilidade acerca da consolidação deste importante seguro, assegurando proteção ampla, socialmente relevante e em conformidade com a legislação.

 

*Rosa Malena Gehlen Peixoto de Oliveira. Especialista em Compliance pela PUC/MG; em Direito Empresarial pelo UniCuritiba; em Direito Processual Civil, pela PUC/PR; e em Direito Aplicado pela EMAP/PR. Certificada em Gestão de Riscos, ISO 31000 Risk Management Professional C-31000, pelo G31000 Risk Institute. Membro da AIDA - Associação Internacional de Direito de Seguro, seção Brasil. Membro do CIST – Clube Internacional de Seguros & Transportes. Membro da Comissão de Direito Securitário, da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná. Advogada e Corretora de Seguros. Diretora Técnica na Artus Consultoria e Corretora de Seguros.

 

REFERÊNCIAS:

https://www.gov.br/antt/pt-br/assuntos/cargas/dadostrc. Acesso em 30 jun.2025.

https://cnt.org.br/documento/cbf59b9e-fd1a-41fc-b230-172c4dc42100. Acesso em 30 jun.2025.

https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/12250/1/NTBalanco_Primeira_Publicacao_Preliminar.pdf. Acesso em 30 jun.2025.

https://www12.senado.leg.br/tv/programas/cidadania-1/2024/05/acidentes-de-transito-fatais-aumentam-no-brasil-conheca-o-sistema-que-pode-prever-acidentes. Acesso em 30 jun.2025.

https://www.cnt.org.br/agencia-cnt/acidentes-e-mortes-nas-rodovias-federais-custaram-ao-pais-quase-13-bilhoes-em-2022. Acesso em 30 jun.2025.

https://clp.org.br/um-diagnostico-sobre-os-acidentes-de-transito-no-brasil/. Acesso em  01 jul.2025.

SUN TZU. A arte da guerra. Traduzido por Chris Tunwell. 2ª.ed. São Paulo: Universo dos livros, 2010.

Como bem anotou Ricardo Bechara Santos “De nada adianta ser obrigatório para o segurado se não o for para o segurador, sabido que a este, por garantia constitucional, está assegurado o direito de aceitar tão somente os riscos e seguros que lhe aprouver.” (SANTOS. Ricardo Bechara. Os Seguros Obrigatórios no Brasil. Sindicato das Seguradoras: ES/RJ. Disponível em: https://sindicatodasseguradorasrj.org.br/artigo/os-seguros-obrigatorios-no-brasil/. Acesso em 30 jun.2025).

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